No final de novembro de 2019 tive um sonho daqueles bem curiosos, daqueles que acordamos e ficamos refletindo sobre os absurdos contidos nele. Mas um detalhe desse sonho fez eu ter uma reflexão negativa sobre o evento:
Ao sair desse terminal, descobria que o país onde estava era a Rússia, e isso se deu pela arquitetura dos prédios ao redor, em especial o Kremlin que era possível ser visto a alguns quilômetros de onde eu estava.
Alguém que eu conversava, que não era possível ver o rosto por que estava como se ao lado ou atrás de mim, me lembrava que chegava a hora de ir embora e que eu deveria me direcionar para o aeroporto. Então sem perder tempo, minha vontade era ir correndo até o Kremlin para tirar fotos, mas essas fotos não eram para recordação ou algo do tipo, o pensamento que vinha a minha mente era que eu tinha que postar no “stories” do Instagram fazendo checking da localização, para que todos vissem ou soubessem de que eu estava na Rússia, e chegava a imaginar a reação de surpresa de todos os seguidores ao saberem que eu estava nesse inusitado país. Por fim, eu não conseguia tirar a foto, e já me via embarcando de volta ao Brasil, com uma profunda frustração: “poxa, nem consegui postar a foto que eu estava na Rússia”.
Esse sonho pode a principio parecer engraçado e sem nada demais. Mas na minha reflexão a respeito pensei em como o meu inconsciente estava contaminado por essa ideia de postar no Instagram, mostrar para os outros aonde estava e o que estava fazendo.
Eu deveria (o meu Eu personagem no sonho) ter aproveitado a viagem, desejado ter experimentado sensações em todos os cinco sentidos desse novo local, interagido com pessoas e criar laços com aquele pais, ou seja, viver intensamente essa incrível experiência, mas, a grande preocupação e por que não o objetivo do meu Eu sonhador, era tirar uma foto para postar no “stories”.
Eu chamo isso de contaminação pelo espirito do nosso tempo.
Jung foi o primeiro a cunhar esse termo “Espirito do nosso tempo”, que segundo ele, é como se a cada momento de uma sociedade existe um “espirito” que nos rodeia impondo o que é certo ou errado, bom ou mal, ou até mesmo o que temos que fazer ou não. Usando essa ideia então, o que o espirito do nosso tempo tem nos imposto? Nossas experiências deixaram de ser individuais e agora são coletivas, mas não no sentido positivo de “coletiva” do tipo que todos podem participar, e sim um “coletiva” onde todos devem ficar sabendo (mesmo que não participem), o que eu estou fazendo, o que eu posso fazer, ou a sorte/privilégio que eu estou tendo no momento em que faço essa postagem.
Perdemos nossa alma em detrimento da vida moderna e do espirito da nossa época. Ou seja, dos valores dominantes de nossa sociedade. No limite dessa perda precisamos recuar, entrar na solidão e em contato com um eu mais profundo, transcendente, além do ego. Essa solidão e reencontro com a alma é um sacrifício do ego, do modo encarar a vida e uma entrega do controle egoísta para algo maior. Uma descida aos infernos, um abandonar de formas seguras de se viver. Algo que beira a loucura. É a solidão consciente, mesmo em meio a vida diária e em meio aos outros.
Não é que as redes sociais sejam o problema, inclusive, já escrevi um texto sobre o por que usamos as redes sociais https://www.trilhasnouniverso.com.br/wp-admin/post.php?post=1067&action=edit, o problema está em nós, seres humanos, que agora escolhemos o que fazer ou aonde ir pensando em como isso vai ficar na foto, ou o quanto de “inveja” vamos provocar em quem nos segue.
Com essa reflexão, comecei a pensar em quantas coisas eu escolho fazer, quantos lugares eu escolho ir por que será “instagramavel”, e não o quanto eu realmente vou me divertir ou eu realmente desejo ir.
O resultado dessa reflexão, é conseguir fazer com que o meu espirito interior, seja mais forte e tenha mais influência sobre o que eu quero fazer e ir, do que o espirito do nosso tempo, que se preocupa apenas em mais uma foto legal em uma rede social onde cada um tenta mostrar que está tendo mais oportunidades do que outros. Tomara que assim, ao menos em meus sonhos, as coisas absurdas que acontecem neles sejam apenas eu experimentando e vivenciado os ocorridos, sem que até mesmo nesse local onírico, eu me preocupe em colocar no stories o que está acontecendo.