Andrômeda: Eu te abraço para abraçar o que me falta
Para sentir o que não se sente
Enxergar o invisível
Pintar o céu todas as vezes que o sol fugir
Criar fantasias a ponto de confundir
Depois de decapitar Medusa e petrificar Atlas, Perseu continuou sua jornada e alcançou a costa da Etiópia. Voando no céu, viu do alto alguma coisa branca entre as escuras rochas da praia. Desceu por curiosidade. A primeira vista pensou se tratar de uma estátua, porém, ao se aproximar um pouco mais, reparou que era uma moça. Estava atada à rocha e chorava desesperadamente. Perseu firmou o pé em terra e se aproximou da jovem. Perguntou-lhe por que a haviam amarrado. Aos soluços, ela se pôs a relatar sua trágica história:
– Meu nome é Andrômeda e sou filha de Cefeu, rei da Etiópia. Fui amarrada à rocha porque preciso pagar por um delito que não cometi! Minha mãe, a rainha Cassiopeia, cometeu um erro inconcebível: quis medir-se em beleza com as formosas nereidas, filhas de Nereu, o adivinho do mar. E ainda brigou com elas no final, insistindo ser a mais bela. As deusas marinhas ficaram muito ofendidas e foram fazer suas queixas não a seu pai, que é calmo e jamais se zanga, mas ao poderoso deus do mar Posídon, o abalador da Terra. A fúria do deus foi irrefreável. Para nos castigar, enviou à nossa terra uma inundação catastrófica! Assim que essa desgraça passou, fez surgir um monstro marinho que devasta nossos campos. Como o mal parecia não ter fim, meu pai foi perguntar ao oráculo o que devia fazer. O adivinho respondeu que o mal só terá fim quando o monstro devorar a filha do rei. O povo não suportando mais a desgraça que se abatera sobre ele, se amotinou. Assim, amarraram-me a esta rocha, e agora estou prestes a ser despedaçada pela fera.
Perseu ficou imensamente comovido. Já estava apaixonado pela linda moça e queria muito salvá-la, para fazê-la sua esposa, mas não sabia com que palavras se dirigir a ela. Então Andrômeda acrescentou:
– Solte-me, caro estrangeiro! E faça de mim sua escrava, se não quiser se casar comigo! Salve-me e lhe serei grata para sempre.
Mal disse isso, a jovem começou a chorar, lamentando seu destino tão impiedoso. Perseu então se apresentou a Andrômeda, dizendo que era filho de Zeus e que podia derrotar o monstro para libertá-la. No momento em que a esperança iluminou o rosto da bela princesa surgiram seus pais, que haviam escutado as palavras de Perseu. Atiraram-se aos seus pés e imploraram para que o herói salvasse sua filha. Eles prometeram dar todas as suas riquezas e o reino inteiro, caso Perseu o quisesse.
Perseu queria apenas desposar Andrômeda. Então, Cefeu e Cassiopeia juraram em nome da deusa Afrodite que lhe dariam a mão da filha em casamento, se ele derrotasse o abominável monstro. Eis que, num instante, o mar começou a espumar e a revolver-se. Um dorso negro surgiu dentre a espuma, mas desapareceu para ressurgir logo em seguida, até que, em pouco tempo, se podia distinguir um dragão marinho tenebroso sobre as ondas.
O momento era crítico. O monstro rasgava as ondas e se aproximava rapidamente. Perseu voou para o céu. Andrômeda e seus pais olharam-no surpresos, quando, subitamente, o herói colocou o elmo de Hades e ficou invisível, deixando todos perplexos. Arremessou-se, invisível, sobre o dragão e de repente desferiu-lhe um golpe de espada no pescoço, mas este era tão grosso, que a criatura não sofreu grande dano, apenas ficou ainda mais enraivecida. O imenso dragão começou a saltar, formando ondas do tamanho de montanhas, e Perseu não via oportunidade de golpeá-lo novamente. O monstro procurava o inimigo, mas não via nada, nem na terra nem no mar; até que enxergou a sombra de Perseu sobre as ondas espumantes. Enganado, lançou-se em direção a ela. Então, o herói viu a chance que esperava e enterrou a espada até o cabo na cabeça da fera. Enfim, como que por magia, o monstro se acalmou; virou-se de barriga para cima no mar e ficou ali, arrastado pelas ondas. Andando agora sobre ele, Perseu tirou o capacete de Hades, Andrômeda e seus pais, vendo-o de pé sobre o dragão, choraram de alegria. Após assegurar-se de que a fera estava mesmo morta, Perseu voou até Andrômeda. Depressa soltou as correntes que a prendiam.
No dia seguinte, prepararam-se as núpcias. No grande salão do palácio reuniram-se todos os nobres da região. Tudo era rico e majestoso. Logo, um cantor, belo como um deus, começou a tocar sua harpa, e a festa teve início. De repente, a canção foi interrompida e todos ficaram mudos e surpresos, pois a porta, escancarando-se, fez um estrondo: Fineu, irmão de Cefeu, entrou acompanhado de vários guerreiros dizendo que Andrômeda pertencia a ele. Cefeu e Cassiopeia ficaram sem palavras.
– Ouçam todos! — gritou um respeitável nobre. — Andrômeda está viva porque Perseu a salvou, arriscando a própria vida! E agora vem Fineu reivindicar seus direitos. Que direitos, Fineu? Onde você andava quando Andrômeda estava presa à rocha? Por que não foi matar o monstro? Por que, em vez disso, você se foi, deixando-a para a morte, sem nem mesmo ir confortá-la em sua desgraça? Quem desfez o noivado? Os pais dela ou você mesmo? E com que direito vem tomá-la agora, ainda por cima à força? Andrômeda pertence a Perseu. Para aquele que discordar disso, há uma solução muito simples: perguntar a ela.
Cefeu, então, perguntou a filha com quem ela se casaria. Andrômeda respondeu que sua vida pertencia a seu salvador e que tomaria o mesmo como esposo.
Fineu irritadíssimo, sem perder tempo, arremessou sua lança em direção a Perseu, que estava parado e pulou para o canto, salvando-se. Mas a arma atingiu mortalmente o peito do cantor. Perseu sacou sua espada para se defender, enquanto, dentre os convidados, vários jovens destemidos e valorosos puseram-se a seu lado. A batalha teve início imediato. Um após outro, os homens de Fineu caíam mortos pelo chão, mas, como eram muitos e pereciam também diversos companheiros de Perseu, a luta continuava desigual.
A própria Atena, vendo o herói em perigo, veio ajudá-lo, protegendo-lhe o corpo com seu escudo. Porém, choviam flechas e lanças, e todos os guerreiros de Perseu já estavam mortos. O valente filho de Zeus guerreava sozinho. Apoiado em um pilar, travava uma luta que não tinha menor chance de vencer. A não ser que… Então Perseu gritou para que fosse seu amigo, virasse os olhos para o outro lado. Dizendo isso, tirou da sacola a cabeça de Medusa e exibiu-a aos inimigos. De repente, o palácio de Cefeu ficou repleto de estátuas. Eram os guerreiros de Fineu, que haviam se transformado em pedra.
Por último restou o próprio Fineu, que, ao ver o mal que se abatera sobre seus companheiros, caiu apavorado aos pés de Perseu e implorou compaixão. O herói, no entanto, mostrou-lhe a cabeça da górgona e o transformou em pedra. Assim, Fineu ficou petrificado na posição mais humilhante, a do guerreiro suplicante.
Perseu desposou Andrômeda, mas não quis prolongar sua permanência no palácio de Cefeu, pois precisava voltar à Grécia.
Com lágrimas nos olhos, Andrômeda se despediu dos pais e acompanhou o marido.
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Fontes e Referências
STEPHANIDES, M. Teseu, Perseu e outros mitos. Trad. POTZAMANN, J. R. M. São Paulo: Odysseus, 2004.
Texto originalmente escrito por Bruna Xavier Demoro no site Mitologia Helenica, em 28 de Maio de 2015.
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